Reciclagem de painéis solares é cada vez mais necessária

18/11/22 | São Paulo

Reportagem publicada pelo Ipesi

O sol poderá se transformar na maior fonte de eletricidade até 2050, respondendo por mais de 25% de toda a geração de energia do mundo, de acordo com Agência Internacional de Energia (AIE). A agência estima que os sistemas solares fotovoltaicos podem gerar até 16% da eletricidade mundial até 2050, enquanto a energia solar térmica – outra tecnologia solar – poderia fornecer 11% adicionais de eletricidade.

Esse crescimento acontece pelas vantagens ambientais, custo baixo, sem contar que é fácil e rápida de instalar. No Brasil, a energia solar já ocupa a terceira posição na matriz energética do país. São mais de 20 gigawatts (GW) de potência instalada da fonte solar fotovoltaica, somando as usinas de grande porte e os sistemas de geração própria de energia elétrica em telhados, fachadas e pequenos terrenos, o equivalente a 9,6% da matriz elétrica do país.

Segundo mapeamento da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR), de janeiro ao início de outubro deste ano, a energia solar cresceu 44,4%, saltando de 13,8 GW para 20 GW. E, nos últimos 120 dias, o ritmo de crescimento tem sido praticamente de um GW por mês, o que coloca a fonte na terceira posição da matriz elétrica brasileira (junho: 15,8 GW, julho: 16,4 GW, agosto: 17,5 GW, setembro: 18,6 GW, outubro: 20 GW).

Esse crescimento, porém, gera preocupações no mundo todo sobre o que fazer com os sistemas de geração de energia fotovoltaica quando eles se tornam obsoletos. Aliás, já faz algum tempo que a questão é discutida, embora ainda sejam poucos os programas nacionais que possibilitem processo de reciclagem de painéis fotovoltaicos mais efetivos.

Num estudo de 2016 sobre reciclagem de painéis solares, a Agência Internacional de Energia Renovável (Irena) alertava que, a longo prazo, a construção de usinas de reciclagem de painéis fotovoltaicos dedicadas fazia sentido. A Irena estimava que os fluxos globais de resíduos fotovoltaicos iriam crescer de 250.000 toneladas no final de 2016 – menos de um por cento da capacidade instalada – para mais de cinco milhões de toneladas até 2050. Também estimava que os materiais recuperados poderiam valer US$ 450 milhões até 2030 e exceder US$ 15 bilhões até 2050.

DEMANDA

Estudo recente da Rystad Energy mostra que a demanda por componentes reciclados de painéis solares fotovoltaicos deve disparar nos próximos anos, conforme o número de instalações aumenta e a ameaça de um gargalo de fornecimento se aproxima. De acordo com a Rystad Energy, os materiais recicláveis ​​de painéis fotovoltaicos no final de sua vida útil valerão mais de US$ 2,7 bilhões em 2030, bem mais que os US$ 170 milhões de 2022. Essa tendência só se acelerará nas próximas décadas e o valor dos materiais recicláveis ​​deverá se aproximar de US$ 80 bilhões até 2050.

A reciclagem fotovoltaica ainda está em estágios iniciais, mas é vista como um elemento essencial da transição energética, com os resíduos fotovoltaicos solares projetados para crescer para 27 milhões de toneladas por ano até 2040. “Nossas previsões mostram que os materiais recuperados de painéis retirados podem representar 6% dos investimentos em energia solar fotovoltaica até 2040, em comparação com apenas 0,08% hoje”, diz o estudo da Rystad Energy.

O estudo destaca, porém, que os aterros sanitários são hoje uma opção fácil e barata, pois os preços atuais de revenda de materiais fotovoltaicos reciclados não compensam os custos de transporte, classificação e processamento. No entanto, a rápida taxa de crescimento de fazendas solares em grande escala dentro da energia solar pode mudar isso. Espera-se que o lado do fornecimento de material encontre gargalos com a crescente demanda por minerais, e a reciclagem pode ser um alívio no fornecimento quando os painéis atingem o final da vida útil.

A demanda pelos materiais e minerais usados ​​na energia solar fotovoltaica deve aumentar com a transição energética, com preços mais altos como resultado provável. O cenário de emissões líquidas zero da Agência Internacional de Energia visa que 40% da energia mundial em 2050 sejam gerados por energia solar – equivalente a 19 terawatts (TW). No entanto, o cenário de 1,6 graus centígrados prevê que 53% serão gerados por energia solar, uma tendência observada nos números e no tamanho das instalações das usinas.

Considerando uma vida útil de 15 anos de um painel fotovoltaico e analisando a atividade de instalação em 2022, a Rystad Energy estima quais regiões e países se beneficiarão mais com a reciclagem de materiais fotovoltaicos em 2037. A China deve responder por 40% das instalações globais este ano e quando esses painéis amadurecerem em 15 anos, o valor estimado de reciclagem será de US$ 3,8 bilhões, de um total global de US$ 9,6 bilhões. A Índia – outra potência solar fotovoltaica asiática – ficará em segundo lugar com um valor estimado de US$ 800 milhões, seguida pelo Japão com US$ 200 milhões em valor estimado. Atrás do continente asiático, o valor do material reciclável na América do Norte em 2037 está projetado para valer US$ 1,5 bilhão, com a Europa com US$ 1,4 bilhão.

O QUE PODE SER RECICLADO

Os componentes do painel fotovoltaico com maior valor são alumínio, prata, cobre e polissilício. A prata representa cerca de 0,05% do peso total, mas representa 14% do valor do material. O polissilício é obtido através de um processo intensivo de energia para atingir a concentração necessária para a eficiência do painel solar, refletida no preço de revenda relativamente alto. O maior volume de material é o vidro, que tem alta taxa de reciclagem, mas valor de revenda relativamente baixo, segundo o estudo da Rystad Energy.

Uma grande quantidade de minerais é necessária para descarbonizar os sistemas globais de energia e evitar a perda de material valioso em fluxos de resíduos padronizados. O cenário de 1,6°C estima o pico de implementação de energia solar em 2035 de 1,4 TW. A essa altura, a indústria de reciclagem fotovoltaica pode fornecer 8% do polissilício, 11% do alumínio, 2% do cobre e 21% da prata necessários para a reciclagem de painéis fotovoltaicos instalados em 2020 para atender à demanda por materiais. Esse potencial de recuperação pode aliviar as tensões no setor de mineração e reduzir a pegada de carbono dos painéis solares fotovoltaicos.

O processo de refino de cobre libera cerca de 4 toneladas de dióxido de carbono (CO2) por tonelada de cobre e é, juntamente com a indústria de mineração mais ampla, uma fonte significativa de emissões de gases de efeito estufa. Potenciais impostos futuros sobre o carbono podem mudar a situação dos custos com ganhos significativos de valor para a indústria de reciclagem.

PROCESSO DE RECICLAGEM

A primeira etapa da reciclagem do painel fotovoltaico é a desmontagem, na qual a estrutura de alumínio e a caixa de junção são separadas do painel, trituradas em pedaços e classificadas por material. Existem máquinas de desmontagem fotovoltaica no mercado hoje, incluindo uma da NPC com sede no Japão, que separa ainda mais as partes do painel antes de moer os restos, aumentando a taxa de recuperação dos materiais. Com a evolução da tecnologia, o mercado é gradualmente percebido com maior entusiasmo e novas empresas estão surgindo, como a startup norte-americana SolarCycle, que gerou um capital inicial significativo de investidores.

Tecnologia, política e viabilidade econômica são barreiras e soluções para a evolução da circularidade de minerais na indústria de painéis fotovoltaicos. Mecanismos regulatórios podem ser uma ferramenta eficiente para criar mudanças rápidas, como já vistas no mercado europeu e em algumas tentativas iniciais nos Estados Unidos, em nível estadual. Em última análise, gargalos e longos prazos na mineração de matérias-primas podem transformar a reciclagem de energia solar fotovoltaica em uma indústria economicamente viável nas próximas décadas.