Consumidor não entende alta na conta de luz na pandemia, mostra pesquisa

02/12/20 | São Paulo

Finanças Yahoo! 

Os consumidores ainda não se entenderam com suas contas de luz durante a pandemia e não conseguem obter com as empresas informações para dirimir suas dúvidas nem resolver cobranças que consideram excessivas.

É o que revela pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec): 93% das pessoas que disseram ter tido aumento na fatura de energia consideraram que o valor cobrado não está coerente com o consumo. Desse total, 52% buscaram a empresa, mas julgaram o atendimento insatisfatório.

É o caso de Carlla Dell Omo, autônoma, que contestou pelos canais de atendimento on-line da Light o salto da conta de luz, de uma média de R$ 160 para R$ 315, mas só conseguiu resolver a cobrança ao ir a um posto de atendimento presencial:

— A informação era que estava em análise, foi passando o tempo e comecei a ficar preocupada em ter a luz cortada por estar com a conta em aberto. Na loja, identificaram que houve um erro e imprimiram outra fatura, dentro da minha média. Foi bem desgastante.

O tamanho da insatisfação dos consumidores com as empresas se reflete no número de queixas feitas à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre faturamento —que incluem aumento de consumo, erro de leitura, faturamento por média, apresentação e entrega da fatura. Essas queixas aumentaram 30% em relação ao ano passado, de 36.709, em 2019, para 47.575 este ano, até 25 de novembro.

As reclamações contra o setor nos Procons, reunidos pelo Sistema Nacional de Informação de Defesa do Consumidor (Sindec), também cresceram e já somam 30 mil a mais entre janeiro e outubro deste ano, do que as registradas no mesmo período de 2019: 125.235 contra 155.180.

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— Observamos com a pesquisa que a maior parte dos consumidores não entendeu a fatura, calculada por estimativa durante o período de isolamento, o que gerou cobranças das diferenças nos meses seguintes. Não descartamos que haja cobrança abusiva, mas o que fica claro é uma séria falha de comunicação — diz Camila Cardoso, coordenadora da pesquisa qualitativa feita pelo Idec, com 594 pessoas.

O publicitário Versales Oliveira viu a conta, que costumava ficar na casa dos R$ 30, saltar para R$ 90 durante a pandemia, cair para zero e voltar a ser cobrada num novo patamar, em torno de R$ 49, sem que tivesse recebido qualquer explicação da Enel:

— Uso esse apartamento como escritório e durante a pandemia até tenho vindo menos dias. A gente se sente refém, fica sem explicação.

Para Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudo do Setor Elétrico da UFRJ, três vetores contribuíram para o quadro de insatisfação atual: a mudança de consumo das famílias, a dificuldade de aferição imposta pelo isolamento e a perda de renda provocada pela pandemia.

O levantamento do Idec mostra ainda que 28% dos internautas que responderam a pesquisa não sabiam da possibilidade de parcelar a diferença de consumo apurada durante a cobrança por estimativa. E que 15,6% não conseguiram realizar o parcelamento por causa da burocracia.

— Nosso temor é que esses problemas voltem a acontecer — caso haja necessidade de novo isolamento e cobranças por estimativa voltem a ser realizadas, frente ao aumento de casos de Covid — se as empresas não fizerem uma mudança emergencial na comunicação e no atendimento ao consumidor — ressalta Clauber Leite, coordenador do Programa de Energia do Idec.

Juliana Domingues, titular da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, conta que já há um grupo discutindo com as empresas do setor as melhores práticas a serem adotadas:

— O atendimento do setor tem se mostrado ineficaz e ineficiente. Precisamos de um aprimoramento urgente diante do risco de uma nova onda de Covid. Num momento sensível como o que vivemos, aumenta a responsabilidade das empresas de serviços essenciais com a qualidade da prestação do serviço e da informação.

A Aneel, em nota, também informa ter cobrado ações por parte das distribuidoras de energia para reduzir as reclamações, sob pena de instalação de processo punitivo.

Marcos Aurélio Madureira, presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia(Abradee), afirma que houve um esforço grande de comunicação das empresas.

Explica que foi um momento complexo da pandemia em que ocorreu uma mudança no perfil de consumo das famílias por causa do isolamento e do deslocamento de atividades de trabalho e escola para casa. Admite, no entanto, que há no que melhorar:

— Estamos sempre discutindo as melhores práticas e os pontos que deram errado.

A Light informa que não houve mudança na medição do consumo durante a pandemia. E destaca que no terceiro trimestre houve uma redução de 24% das queixas sobre a empresa à Aneel.

No mesmo período, a companhia diz ter registrado alta de 9,5% no faturamento residencial comparado ao mesmo período de 2019, como reflexo da pandemia. E acrescenta ter oferecido a possibilidade de parcelamento a seus consumidores.

Sobre a queixa de Carlla, a empresa informa que a fatura mais alta espelhava a leitura feita no local, conforme já teria sido informado, apesar de consumidora ter obtido a revisão da conta.

A Enel Distribuição São Paulo destaca que a cobrança por média de consumo dos 12 meses anteriores foi autorizada pela Aneel no pico da pandemia. A leitura presencial foi retomada a partir de junho, e a diferença entre o valor cobrado e o real consumo, automaticamente lançado na conta. A empresa também diz ter oferecido o parcelamento.

Em relação ao caso de Oliveira, a empresa informa que as faturas de abril e maio foram cobradas por estimativa e os valores pagos a mais abatidos em junho e junho.