Conheça as 7 regiões que lideram os hábitos de consumo sustentável no Brasil e aquelas que estão atrás

14/04/23 | São Paulo

Reportagem publicada pelo Um Só Planeta

Cidades e estados consolidam práticas em diferentes áreas no país, mas caminho para um desenvolvimento realmente sustentável ainda é longo
Em um país com dimensões continentais como o Brasil não é tarefa fácil garantir que a maioria da população pratique hábitos sustentáveis . Cada região, estado e município reflete diretamente seu contexto sociopolítico e econômico e depende da ação coordenada do poder público e do setor privado para incentivar e conscientizar seus cidadãos a respeito dos efeitos positivos dessas ações.

O último Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades (IDSC) , ferramenta do Instituto Cidades Sustentáveis que oferece uma visão integrada dos mais de cinco mil municípios brasileiros em cada um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), apontou que as 10 cidades com maior pontuação estão no estado de São Paulo enquanto os 10 municípios com menor pontuação pertencem à região Norte do país.

“As cidades com alto desenvolvimento sustentável indicadas pelo índice são fruto de décadas de ações integradas entre políticas públicas e acesso à educação de qualidade e saúde que propiciam trabalho e renda para a sociedade. Além disso, é fundamental desenvolver uma sociedade civil atuante que busque avançar nesses processos pelo desenvolvimento”, explica Jorge Abrahão, diretor-presidente do Instituto Cidades Sustentáveis.

O IDSC divulgado no ano passado pontua o fato de que nenhuma cidade brasileira atingiu o “nível muito alto de desenvolvimento”, uma das classificações criadas pelo índice. Para Igor Pantoja, assessor de coordenação do ICS, esse é um indicativo importante de que o Brasil ainda não está no melhor caminho para o desenvolvimento sustentável. “Precisamos de um programa coordenado para atingir esse objetivo. Não é suficiente que as ações sejam feitas somente a nível municipal. Precisamos de uma estratégia coordenada entre os governos estadual e federal também”, afirma.

Segundo Bruna Tiussu, gerente de comunicação e conteúdos do Instituto Akatu, organização sem fins lucrativos que trabalha para a sensibilização e mobilização para o consumo consciente, existe uma necessidade da sociedade desenvolver mais consciência a respeito do seu protagonismo nessa história. “As pessoas têm grande poder de influência, tanto com as empresas quanto com os governos. Nosso objetivo é justamente empoderar os cidadãos para que eles entendam os impactos de seus hábitos de consumo para o desenvolvimento sustentável como um todo”, explica.

Confira as regiões que se destacam em 7 hábitos sustentáveis no país:

1. Plantar árvores

Ambientes urbanos normalmente registram temperaturas mais altas do que as áreas rurais próximas, fenômeno conhecido como “ilhas de calor urbano”. Segundo pesquisa conduzida pelo Instituto Global de Saúde, na Espanha, o plantio de árvores pode reduzir mortes pelo calor. Os autores apontam que durante o verão de 2015 nas cidades europeias, um terço das mortes prematuras atribuíveis a altas temperaturas poderia ter sido evitada aumentando a cobertura arborizada urbana em 30%.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Goiânia é a cidade mais arborizada do Brasil dentre os municípios com mais de um milhão de habitantes

No último ano, foram plantadas quase 200 mil mudas de diversas espécies na capital, uma vez que 9 mil árvores tiveram que ser removidas e a prefeitura da cidade tem plantado 22 árvores para cada uma que tem que ser retirada.

A capital também conta com o programa Disque-Árvore, por meio da Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma), que consiste no plantio de árvores nativas do Cerrado nas ruas da cidade. A solicitação é feita pelo número de telefone e o cidadão responde a um formulário, além de enviar seus dados pessoais junto com fotos da calçada onde pretende realizar o plantio.

Os técnicos avaliam as condições do local, indicam a melhor espécie e o plantio é agendado. Dados da pesquisa Hábitos Sustentáveis e Consumo Consciente , realizada em 2022 pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), apontam que as região Nortes e Centro-oeste apresentaram o maior percentual de pessoas que informaram plantar árvores com frequência (30%), enquanto a região com menor percentual foi o Sudeste, com 17%. Seguida de Sul e Nordeste.

2. Economizar água

O Brasil desperdiça 40% de toda a água potável que é captada. Apesar da crise hídrica vivida no país e em diversos outros países do mundo, estudo do Instituto Trata Brasil lançado em 2022 aponta para um desperdício de quase metade da água tratada em solo nacional devido a vazamentos e falhas na rede hídrica.

As cidades que dão exemplo positivo estão no estado de São Paulo: Santos (SP) e Limeira (SP) lideram o ranking empatadas com 12% de desperdício de sua água potável. Por outro lado, os estados que registraram maior desperdício de água potável são Amapá (74%), Amazonas (68%) e Roraima (65%).

Bruna Tiussu, do Akatú, reforça a necessidade de considerar o contexto dessas cidades e a dimensão desses estados na hora de avaliar o cumprimento de práticas mais sustentáveis. “O Brasil é um país com alta taxa de desigualdade. Precisamos levar isso em consideração para fazer essa análise. Quem são as pessoas que têm acesso à informação e onde elas moram? Os contextos de renda e de educação são fundamentais para analisar a conscientização a respeito de hábitos mais sustentáveis”, reforça.

Pantoja, do ICS, concorda com a necessidade de levar em consideração as várias dimensões do desenvolvimento sustentável para fazer esta análise. “É inegável que estados do Sul e Sudeste do país apresentam maiores investimentos sociais. Quanto menos infraestrutura o município apresenta, menores as taxas de educação e de saúde, e maior a exploração predatória daquele ambiente. A degradação ambiental é essa fragilidade do ponto de vista social e econômico”, afirma.

3. Separar resíduos

Segundo a última edição do Panorama dos Resíduos Sólidos , publicado em 2022, 25% das cidades brasileiras (1.400 municípios) não apresentam coleta seletiva, ou seja, políticas públicas que promovam a separação dos resíduos recicláveis descartados pela população. Das mais de 80 milhões de toneladas de lixo produzidas anualmente, o Brasil recicla menos de 4%.

Na esfera individual, mais de 70% dos brasileiros não separam seus resíduos entre comum e reciclável, aponta a pesquisa do Ibope, em parceria com a Abrelpe e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Segundo a pesquisa, 77% dos brasileiros ainda descartam os plásticos de forma inadequada. “Temos uma política nacional de resíduos sólidos que não é implementada e o nível de educação ambiental no Brasil é baixíssimo. Não temos conscientização e nem políticas para garantir que materiais sejam reciclados ou proibir embalagens de uso único, por exemplo”, aponta Pantoja.

O estado que tem se destacado é o Paraná . Segundo a Associação Brasileira de Embalagem de Aço (Abeaço), durante o primeiro trimestre de 2021, o estado sulista reciclou mais de 4,5 mil toneladas de embalagens de aço de tintas e alimentos, liderando o ranking nacional de reciclagem de latas de alumínio. No total, o país reciclou 7,5 mil toneladas. Segundo a pesquisa da CNI , a região sul do país também é a protagonista no hábito de separar os resíduos para reciclagem, totalizando em 68% da população. A região nordeste é a que menos pratica essa ação (39%).

“No Akatu, nós consideramos que a prática de consumo consciente precisa ser viabilizada para acontecer. No hábito de separação de resíduos, isso só faz sentido se houver infraestrutura de coleta. Por isso eu volto à questão de que sem a ação direta do poder público ou de empresas, por meio de incentivos e campanhas, não tem como construir uma cultura local de separação de resíduos e coleta seletiva”, aponta Tiussu.

O Norte do país abriga o estado que mais produz lixo urbano: o Amazonas. Praticamente todos os 62 municípios jogam seus resíduos em lixões impróprios. Segundo dados da ONU , é como se cada habitante de Manaus descartasse diariamente mais de 1 kg de lixo.

4. Consumir orgânicos

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) são registradas 20 mil mortes por ano devido ao consumo de agrotóxicos. Além dos malefícios dessas substâncias químicas para as populações, elas também são responsáveis pela contaminação do solo e da água em áreas onde as plantações não são orgânicas. Em 2019, pesquisa encomendada pelo Conselho Brasileiro da Produção Orgânica e Sustentável (Organis) apresentou que 19% dos brasileiros consomem algum produto orgânico; 35% consumiram produtos orgânicos nos últimos seis meses e 67% estão dispostos a aumentar a compra de produtos.

Na Região Sul está o maior percentual de consumo (48%), seguido pelo Sudeste, com 42%. “Segundo a Pesquisa Akatu de 2018, 60% dos entrevistados apontam a necessidade de esforço como a maior barreira para adoção de hábitos sustentáveis e o preço está dentro desse esforço. As pessoas precisam ter acesso aos benefícios que elas e o ambiente terão com a prática. Quando elas têm essa informação fica mais fácil tomar uma atitude. Elas passam a enxergar o valor, para além do preço, a partir de benefícios concretos para o ambiente e para a sua saúde”, afirma a gerente de comunicação.

5. Usar bicicleta

A nível global, os meios de transporte contribuem com 25% das emissões globais de gases de efeito estufa. Deixar de usar carro ou transportes públicos e andar de bicicleta, por exemplo, se tornou uma alternativa econômica e sustentável para melhorar este dado. Uma pesquisa realizada pela Multiplicidade Mobilidade Urbana revelou que o Brasil tem uma frota estimada de mais de 33 milhões de bicicletas , sendo a cidade de Vitória (ES) líder da pesquisa com maior concentração de bikes , seguida de Campo Grande (MS) e Aracaju (SE).

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), apenas 7% dos brasileiros usam a bicicleta como meio de transporte principal. “Em cidades menores, a escolha pela bicicleta reforça um gatilho movido pela economia. Já em grandes centros urbanos, vemos que o uso da bicicleta pode ser mais incentivado pela consciência ambiental. Ainda assim, para vermos esse hábito ganhar escala, será necessário cada vez mais políticas públicas que incentivem o uso de bicicleta, por meio de ciclovias, por exemplo, e que diminuam os riscos”, explica Tiussu.

6. Evitar o consumo de carne bovina

Não é novidade as graves consequências do consumo de carne bovina para a saúde dos indivíduos e do Planeta. As taxas de registro e mortalidade de câncer colorretal, diabetes tipo 2 e doença cardíaca coronária têm aumentado no mundo – e as três estão ligadas ao consumo de carne vermelha e processada, segundo estudo do BMJ Global Health

A nível ambiental, além das emissões de dióxido de carbono proveniente do desmatamento para conversão de floresta em áreas de pasto, as emissões de metano, um dos principais gases de efeito estufa que causa 1 milhão de mortes prematuras a cada ano, também é consequência direta da pecuária.

Apesar dos dados impressionantes, apenas 38% da geração Z associa consumo de carne com as mudanças climáticas, segundo uma pesquisa realizada na Austrália . Dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2017-2018 do IBGE apontaram para o consumo de 29,1 quilos de carnes per capita a cada ano, e Mato Grosso do Sul como o estado que mais consome carne bovina in natura no Brasil. Não existem dados sobre o estado ou município que menos consome o produto.

“Alimentação é um dos temas de entrada para hábitos mais sustentáveis. Nos últimos anos, o tema do vegetarianismo e veganismo tem aparecido mais, principalmente relacionado à crise climática. Ainda assim, percebe-se a necessidade de esforço, de educação e de para uma mudança real de cultura acontecer”, destaca Tiussu.

7. Utilizar energia solar

Segundo mapeamento da SolarEdge, com base nos dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR), o Brasil possui 1,1 milhão de residências com telhados preparados para utilização de energia solar.

Analisando a difusão de painéis solares no país em proporção à população entre os 10 estados que lideram este ranking, temos o estado do Mato Grosso em primeiro lugar, com uma casa com energia solar para cada 60 habitantes. O segundo e terceiro lugar são ocupados, respectivamente, pelo Mato Grosso do Sul (66 habitantes) e Rio Grande do Sul (80 habitantes).

Apesar dos números brutos mostrarem que São Paulo lidera este ranking, por apresentar 228 mil moradias com essa tecnologia, quando analisamos este dado em proporção à densidade populacional vemos que o estado é um dos piores, com 1 casa com energia solar para cada 202 habitantes. E quem está mais atrás dele é o Rio de Janeiro (256 habitantes) e Bahia (300 habitantes).

“Ainda é fundamental o movimento de levar energia solar como alternativa para regiões e comunidades onde não existe o acesso à energia elétrica. É uma solução possível e que no médio e longo prazo sai mais em conta também economicamente”, aponta Tiussu.

O governo brasileiro anunciou no final de março que irá zerar os impostos federais sobre painéis solares até dezembro de 2026. O presidente incluiu o segmento de painéis fotovoltaicos, voltados para a produção de energia solar, no Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores (PADIS). A isenção vale para painéis solares fabricados por empresas habilitadas programa e com projeto aprovado.