AGENTES DO SETOR AVALIAM QUE RESOLUÇÃO DA GD É “EQUILIBRADA”, MAS NÃO DESCARTAM QUESTIONAMENTOS

08/02/23 | São Paulo

Reportagem publicada pelo Broadcast

Após uma longa discussão, a Agência Nacional de Energia  Elétrica (Aneel) definiu ontem, 7, as principais regras para regulação do marco legal da geração distribuída (GD), que estabeleceu o tratamento para os consumidores que geram a própria energia. No setor, parte dos agentes avalia que o texto construído é equilibrado”, mas algumas entidades e associações não descartam levar a discussão sobre alguns pontos para outros âmbitos, como o Judiciário e o próprio Congresso Nacional.

A cobrança do transporte e do custo de disponibilidade, taxa mínima praticada pelas distribuidoras pelo serviço prestado, é o principal ponto de conflito entre agência, distribuidoras e empreendimentos de GD. No caso do segmento, a cobrança é feita quando há injeção da energia excedente gerada pelo consumidor na rede da concessionária. Parte dos agentes, contudo, entende que a Aneel estaria criando cobranças duplicadas pelas distribuidoras.

O diretor atendeu pleito da Associação Brasileira de Energia Fotovoltaica (Absolar) para que o texto da resolução seja claro no sentido de não permitir uma cobrança em duplicidade que consuma os créditos de energia dos consumidores e ainda implique no pagamento por este do custo de disponibilidade.

Para o diretor de regulação da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Ricardo Brandão, as soluções encontradas pela agência reguladora foram equilibradas e atenderam a lei. Sobre a questão das cobranças, o especialista afirmou que se tratam de pagamentos para serviços distintos. “O esclarecimento foi especialmente para tornar a aplicação da norma, ao traduzir os conceitos e deixar claro que não há tripla cobrança e a forma que cada um desses componentes pode ser faturado”.

Na outra ponta, a vice-presidente de Geração Distribuída da Absolar, Bárbara Rubim, avalia que a alteração na redação para esclarecer esse ponto foi um avanço positivo, mas aguardava que outros dispositivos também fossem contemplados na proposta. Entre eles, a questão da cobrança de Tusd G para os consumidores em baixa tensão. “Nesse ponto, entendo que essa deliberação é uma afronta ao texto do marco legal. A proposta da Aneel estabelece um ônus a este consumidor não previsto e nem permitido por Lei.”

Ela cita como outro exemplo o tratamento para os consumidores “B Optantes”, aqueles que, embora sejam atendidos em média ou alta tensão, podem optar por ser faturados pela tarifa do Grupo B. “O mais crítico é o fato da agência propor que esse consumidor, que tenha optado antes da resolução, vai ficar sujeito às restrições supervenientes, pois não deixa ser uma maneira de criar uma regra retroativa”, disse. “O setor vai analisar se o melhor lugar para tratar dessas discordâncias é no Congresso ou Judiciário.”Para Carlos Evangelista, presidente do Conselho da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), a regulamentação introduz a tarifa binômia para os consumidores de baixa tensão, o que prejudica exatamente os menores e os mais vulneráveis. “Isso não está previsto no texto da lei e vai frontalmente contra o espírito da Lei 14.300, que foi amplamente debatida no Congresso e, agora, o órgão regulador muda para pior. A ABGD trabalhará em todas as instâncias para reverter essa decisão”, afirmou em nota.

O Instituto Nacional de Energia Limpa (Inel) avalia que o voto do relator desagradou “todo o setor de geração distribuída e representa um retrocesso para o setor elétrico  nacional”. Para a entidade, a resolução promove uma reinterpretação da lei, o que consideram uma “grave ilegalidade” e fora os limites da competência da agência no
processo. “Sem apresentar nenhum fato novo, a agência ultrapassou os limites de sua atuação para reabrir a discussão de política pública no setor de geração distribuída, um tema já pacificado após intensa discussão com participação de entidades do setor e que foi referendada pelo Congresso Nacional”, afirmou o secretário de assuntos regulatórios da entidade, Lucas Pimentel, por nota.

Expansão da GD

Ana Capelhuchnik, diretora jurídica e sócia da Lemon Energia, avalia positivamente a discussão do tema na Aneel, que, segundo ela, foi receptiva às sugestões do setor. “Em um dos pontos mais críticos, o prazo mínimo de 180 dias para alterar as titularidades dos consórcios, o relator Hélvio Guerra entendeu que o prejuízo para geração compartilhada seria muito grande e decidiu por excluir esse ponto da redação”, ressaltou. O estabelecimento de um prazo foi sugerido pela área técnica.

Contudo, ela ressalta que gera preocupação o fato de que alguns atores privados do mercado tentem argumentar, no âmbito da Aneel, que a agência deveria tolher o crescimento da geração distribuída sob o argumento que essa modalidade opera dentro de um subsídio. “Isso está especificado em lei e foi pensado como um mecanismo de transição.”

Pedro Dante, sócio da prática de Energia do Lefosse, avalia que a regulamentação deve confirmar o impulsionamento dos novos projetos de geração própria de energia para consumidores no mercado cativo. Segundo ele, muito do que foi e será feito sobre a GD servirá de base para a expansão do mercado livre de energia. “Havia muita incerteza no mercado sobre o limite da democratização da Geração  Distribuída. Ou seja, qual seria o teto para crescimento dessa modalidade de geração  própria, considerando a complexidade jurídica e regulatória para a implementação de  um projeto”, disse. “A parceria jurídica e comercial entre geradores e grandes marcas  nacionalmente reconhecidas é o caminho para possibilitar que um grande número de consumidores possa ingressar nas estruturas passando a gerar a sua própria energia, mesmo que de forma virtual com a locação de uma “parcela” de uma fazenda solar  distante do seu local de consumo.”