Com risco de apagão, empresas investem R$ 12 bi em termelétricas e conta de luz vai ficar mais cara

27/09/21 | São Paulo

Reportagem publicada no O Globo


Leilão em outubro aceitará energia de usina a óleo e a gás com preço quatro vezes maior. Só neste ano, custo com essas fontes energéticas foi de R$ 13 bi

BRASÍLIA, SÃO PAULO E RIO – Conhecido por explorar bem seu potencial hídrico para a geração de energia elétrica, o governo decidiu, para afastar o risco de apagão em ano eleitoral, concentrar sua estratégia na expansão da energia termelétrica, em vez de apostar em outras fontes renováveis. Como consequência, até 2025, pelo menos, a matriz energética terá uma participação maior de fontes mais poluentes, e o consumidor enfrentará custos mais elevados.

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Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), estudos e simulações do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) apontam que o acionamento das térmicas entre janeiro e novembro deste ano custará R$ 13,1 bilhões. Isso será compensado na conta de luz.

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E novos negócios estão surgindo: até 2026, estão previstos investimentos de R$ 12 bilhões em usinas térmicas no país.

Em outubro, o MME fará um leilão, em processo simplificado, para compra de adicional de energia, com prazo previsto para abril de 2022 a dezembro de 2025 e possibilidade de entrega antecipada. Isso é necessário para recompor o nível dos reservatórios das hidrelétricas. Mas o impacto na conta de luz deverá ser ainda maior.

Poderão participar do leilão térmicas a gás com custo de até R$ 750 por megawatt-hora (MWh) e a óleo diesel e óleo combustível de até R$ 1 mil/MWh. A fatura sairá mais cara do que os leilões anteriores, mas o governo argumenta que o “prazo desafiador” para entrada em operação resulta em custo mais alto. E aposta que ampliar a concorrência possa segurar os preços.

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Fatia na matriz já chega a 21%

Em agosto, para efeito de comparação, o preço de referência do leilão para térmicas foi de R$ 266,86/MWh. No Ambiente de Contratação Regulada (ACR), onde as compras se dão por leilões, despacho do ano passado definia o valor médio do ACR em R$ 253,50/MWh para 2021. Fontes renováveis, como eólica e solar, têm preço médio de R$ 150/MWh.

A estratégia vai manter o patamar da produção de energia termelétrica acima da casa dos 20% por mais tempo. Diogo Lisbona, pesquisador do Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ceri), lembra que a participação das termelétricas começou a avançar após o racionamento de 2001.

Pelos dez anos seguintes, essa produção esteve no patamar de 9%, subindo a partir de 2012. Este ano, a média está em 21%.

— Neste momento de crise, as termelétricas chegam a responder por 32% da geração, e as hidrelétricas estão no menor patamar, por volta de 50% — diz Lisbona.

Com isso, os investimentos em usinas térmicas vêm crescendo. Pelo menos 19 unidades novas estão sendo construídas, e outras estão sendo reformadas, religadas ou adiantadas. Só as usinas em construção vão adicionar 5.080MW ao Sistema Interligado Nacional até 2026.

— O parque térmico brasileiro é antigo, mas é uma alternativa fundamental com a crise hídrica e a intermitência das fontes solar e eólica. A despeito de ser uma energia mais cara, ela dá segurança e garantia de suprimento ao sistema — diz Gustavo Carvalho, gerente de Preços e Estudos de Mercado da Thymos, consultoria especializada em energia.

R$ 4 bi para usinas antigas

Até 2026, estão previstos investimentos de R$ 12 bilhões em usinas térmicas no país. Desse total, pelo menos R$ 4 bilhões serão utilizados no retrofit de unidades antigas. A maioria das novas usinas térmicas vai operar com gás, especialmente do pré-sal, como fonte de energia.

Luiz Barata, consultor do Instituto Clima e Sociedade (iCS), ressalta que é possível remodelar usinas térmicas antigas, a óleo e carvão, para gás, para tentar baixar o custo. Mas afirma que, com os preços dos novos leilões, é difícil conter a escalada do preço.

Ele critica a opção pelas termelétricas — que demoram mais tempo para entrar em operação, são mais caras e mais poluentes — e diz que o país deveria apostar nas fontes renováveis bem planejadas e operadas.

— Há um espaço enorme para inclusão dessas fontes (eólicas e solares). Elas não precisam entrar acompanhadas de térmicas no Brasil, porque se formos capazes de recuperar os níveis dos nossos reservatórios, as próprias hidrelétricas vão complementar ou sanar a intermitência das fontes renováveis — afirma Barata.

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Pelo menos 60% da capacidade de geração de energia pelas termelétricas está concentrada no Estado do Rio, para aproveitar a produção de petróleo e gás natural.

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O governo antecipou a entrada em operação de uma usina em São João da Barra, no Porto do Açu, no norte do estado. A Gás Natural Açu liberou, no último dia 16, a operação comercial da usina movida a gás GNA I, um investimento de US$ 1 bilhão.

Segundo o MME, a entrada em operação foi antecipada em cinco meses. Mas, apenas quatro dias depois de entrar em operação, a GNA I ficou dois dias parada, por problemas técnicos. Ela tem 1.338MW de capacidade instalada, podendo abastecer seis milhões de residências.

Novas usinas

Perto de São João da Barra, vai a pleno vapor a construção, pela Shell, de uma usina a gás, a Marlim Azul. A previsão é que seja inaugurada em janeiro de 2023.

A Âmbar Energia, companhia controlada pelo grupo J&F, dona da JBS, comprou em junho a Central Térmica Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, com 640MW. A unidade pertencia ao grupo argentino San Atanasio Energía (Saesa).

Ainda estão sendo acertados detalhes do contrato de fornecimento de gás, que vem da Argentina, mas a expectativa é que ela entre em operação em breve, a tempo de ajudar a aliviar o sistema na seca. Procurada, a empresa não informou o valor do negócio e nem a data de ativação da usina.

Em Mato Grosso do Sul, a termelétrica William Arjona, em Campo Grande, foi religada em julho, depois de quatro anos parada. A usina foi comprada da Engie pela Delta Energia em 2019. Pelas projeções da empresa, a unidade vai gerar 190 MW, o suficiente para abastecer mais da metade da capital, Campo Grande.

No entanto, seu custo de geração de energia é de R$ 1.500 por MWh, bem superior ao de outras térmicas e muito acima do de uma hidrelétrica, em torno de R$ 180/MWh.

— O valor é alto, mas o custo de um déficit de energia para a economia seria ainda muito maior — diz Carvalho, da Thymos.

‘Poupança’ de água

Apesar da demanda pela energia térmica, a Petrobras decidiu colocar em manutenção a usina de Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul. Isso mesmo com o pedido, feito em julho pelo ONS, de que todas as usinas adiassem suas manutenções a fim de aumentar a disponibilidade de geração.

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Em nota, a Petrobras disse que “solicitações de adiamento, postergação ou aprovação de paradas fazem parte da rotina operacional e que seguirá atendendo, sempre que possível, às necessidades do sistema, garantindo a segurança operacional de suas unidades.”

Em julho, o Brasil registrou recorde na geração de energia por usinas termelétricas e a menor produção por hidrelétricas para o mês desde 2002, segundo dados do ONS.

De acordo com a entidade, as termelétricas geraram 18.625 megawatts-médios (MWmed) em julho de 2021, maior patamar histórico e o dobro do verificado em março, 9.341 MWmed.

Para Luiz Carlos Ciocchi, diretor-geral do ONS, a recomendação é que as termelétricas, mesmo mais caras, continuem ligadas no período úmido e em 2022. Com isso, diz, o país fará uma “poupança” nos reservatórios.

Em São João da Barra, no Rio, GNA I teve sua operação antecipada por conta da crise hídrica (Foto: Foto: Divulgação)

1ª – Hidrelétrica de Três Gargantas. Construída no Rio Yang-tsé, tem capacidade de 22.500 MW (Foto: Foto: Reprodução)

2ª – A usina hidrelétrica de Baihetan está equipada com 16 unidades geradoras hidrelétricas, cada uma com capacidade de 1 milhão de quilowatts, a maior de unidade única do mundo (Foto: Foto: – / AFP)

3ª – Usina Hidrelétrica binacional de Itaipu. Foi a maior do mundo desde a inauguração, em 1984, até o 2012. Produz até 14.000 megawatts (Foto: Foto: Alan Santos / PR)

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5ª – Usina de Belo Monte é a segunda maior do Brasil, com capacidade para 11.233 megawatts (Foto: Foto: Agência O Globo)

Para economizar, ligue o aparelho apenas quando for dormir e desligue logo ao acordar. Uma opção é usar a função sleep, disponível em alguns modelos. Outro cuidado é manter o ar-condicionado em temperatura adequada. Especialistas recomendam 23ºC. Não é preciso colocar temperatura muito baixa, para não gastar muita energia. (Foto: Foto: Pixabay)

Em uma família com quatro pessoas, o uso do chuveiro elétrico corresponde a cerca de 25% da conta de luz. Para economizar, evite banhos muito longos e dê preferência a usar o chuveiro no modo verão, que economiza até 30% de energia (Foto: Foto: Pixabay)

Quando a porta fica muito tempo aberta, o motor funcionará mais, gastando mais energia. É importante também manter a borracha de vedação da porta da geladeira em bom estado. Ao viajar, uma opção é esvaziar a geladeira e desligá-la da tomada. (Foto: Foto: Pixabay)

A substituição de lâmpadas incandescentes pelas de LED pode gerar uma redução de 75% a 85% no consumo de energia. Além disso, essas lâmpadas duram mais. Em relação às lâmpadas fluorescentes, a economia é de cerca de 40% (Foto: Foto: Pixabay)

Dê preferência a lavar uma grande quantidade de roupas, para economizar água e energia. Evite colocar muito sabão, para não ter de enxaguar duas vezes. Na hora de passar, a melhor opção é juntar roupas e passar uma grande quantidade de uma vez. Desligue o ferro quando for interromper o serviço. Use a temperatura indicada para cada tipo de tecido e comece pelas roupas mais leves. (Foto: Foto: Pixabay)

O uso do ventilador de teto durante 8 horas por dia gera um gasto de apenas R$ 18 por mês. Mesmo assim, é importante evitar deixar o aparelho ligado quando não houver ninguém no cômodo. Na hora de comprar, lembre-se que quanto maior o diâmetro das hélices, maior o consumo de energia. (Foto: Foto: Pixabay)

No caso dos eletrônicos, a recomendação é desligar o televisor e os videogames quando ninguém tiver usando. Retirar os aparelhos da tomada também ajuda a poupar energia. (Foto: Foto: Arquivo)

Hirelétrica de Marimbondo: ONS já espera que agosto se encerre com um nível de armazenamento para o Sudeste/Centro-Oeste piores que 2001 (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

Usina Hidrelétrica de Marimbondo fica na divisa de São Paulo com Minas Gerais, entre os municípios de Icém e Fronteira (Foto: Foto: Michel Filho / Agência O Globo)

Nível do reservatório de Marimbondo está abaixo dos 30% (Foto: Foto: Michel Filho / Agência O Globo)

Com o nível baixo, mariscos ficam presos na cerca que fica dentro da represa da Hidrelétrica (Foto: Foto: Michel Filho / Agência O Globo)

Unidade foi construída entre 1971 e 1977 e é a segunda maior sob controle de Furnas (Foto: Foto: Michel Filho / Agência O Globo)

Afetado pela estiagem, nível só alcançou o máximo, de 90%, em maio do ano passado (Foto: Foto: Michel Filho / Agência O Globo)

Régua de medição do nível da água na represa de Marimbondo mostra situação preocupante (Foto: Foto: Michel Filho / Agência O Globo)

A rede de distribuição de energia da usina, em detalhe (Foto: Foto: Michel Filho / Agência O Globo)