Crise hídrica ameaça safras de culturas irrigadas

19/08/21 | São Paulo

Reportagem publicada no O Globo

Responsável por abastecer o mercado interno, colheitas de feijão, café, tomate e hortaliças em geral serão menores este ano. Área atendida será reduzida em 30% em 2021

BRASÍLIA – Ao mesmo tempo em que o país se vê sob ameaça de novo racionamento de energia com a crise hídrica, o agronegócio começa a sentir os efeitos da falta de chuvas no país. No setor que mais cresce no país, a agricultura irrigada, aquela em que é aplicada água diretamente na raiz das plantas e mais presente na produção de alimentos para o mercado interno, já convive com aumento de custos e quebra de safra.

Crise hídrica: Nível dos reservatórios de hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste é o mais baixo da História

A falta de chuvas pode frear novos negócios e é mais uma pressão sobre os preços dos alimentos que acumulavam alta de 15, 27% nos últimos 12 meses até julho.

De acordo com a Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), já foram observadas altas em torno de 30% no custo da irrigação em vários estados. Representantes do agronegócio no Sul do Brasil também estimam perdas de até 50% na produção da dupla mais famosa do prato do brasileiro: o arroz e o feijão.

1 de 9

Foto Anterior Proxima Foto

A falta de chuvas e os baixos níveis dos reservatórios começam a afetar a produção de produtos cultivados tanto na chamada agricultura de sequeiro (na qual a irrigação pode ocorrer somente nos períodos secos) como na agricultura irrigada, onde o uso do direcionamento da água para as plantas é constante.

No Paraná, o maior estado produtor, houve queda de 20% em relação ao que foi projetado para a segunda safra de feijão, informou o Instituto Brasileiro do Feijão e Pulses (Ibrafe). Ao sul do Rio Grande do Sul, as perspectivas para o início do plantio de arroz irrigado são preocupantes.

CNI: Racionamento de energia já está no radar de 62% dos empresários da indústria

Desde 2018, chove menos do que deveria na região, e a principal fonte, a barragem do Arroio Duro, que acumula água no inverno e na primavera para irrigar no verão, está bem aquém da capacidade, com 38%, quando deveria ficar, nesta época, estar em 70%.

Everton Fonseca, engenheiro agrônomo e gerente de operação e manutenção da Associação dos Usuários do Arroio Duro, relata que o volume de chuvas está 30% do normal para esta época do ano. Ele é um dos responsáveis pela distribuição de água para três municípios com capacidade para irrigar 20 mil hectares.

No ano passado, a área irrigada diminuiu 26% e, este ano, a redução chegaria a 30%, em uma projeção conservadora.

—Se as previsões se confirmarem, a queda pode chegar a 50% — prevê Fonseca.

Não é só falta de chuva: Entenda como o Brasil está, de novo, à beira de um racionamento

Segundo ele, a população de Camaquã, Arambaré e Cristal está se abastecendo com caminhões pipas. Grande parte dos moradores que está no campo usa poços artesianos, ou cacimbas superficiais.

Impacto no IDH

De acordo com o último censo agropecuário do IBGE, a área plantada da agricultura familiar no Brasil é de 81 milhões de hectares. Segundo o Atlas Irrigação da Agência Nacional de Águas (ANA), 8,2 milhões de hectares são irrigados:

Aneel: Conta de luz deve subir 16,7% em 2022, estima Aneel

—Os números são expressivos, dependendo do tipo de cultura — ressalta Jordana Girardello, assessora técnica da Comissão Nacional de Irrigação da CNA.

1 de 7

Foto Anterior Proxima Foto

Segundo ela, 90% do arroz produzido no Brasil são irrigados, e o café cultivado por esse sistema corresponde a 30%, ou um terço do que é colhido no país. Atualmente, há três safras por ano de feijão. A terceira safra se dá 100% por irrigação e equivale a 20% do total colhido no país.

O tomate industrial, cultivado por gotejamento e usado na fabricação de polpa, molho e ketchup, é outro forte exemplo de produto a ser seriamente afetado, assim como as hortaliças em geral.

Professor de Finanças do Ibmec, Haroldo Monteiro diz que a falta de chuvas influencia principalmente o preço de alimentos como frutas, verduras e legumes:

Racionamento:Falta de chuvas leva cidades de SP e outros estados a adotarem restrições ao uso da água

— O consumidor vai sentir os efeitos na feira.

Segundo o economista-chefe da Órama, Alexandre Espírito Santo, uma redução na produção dos alimentos em razão da seca pode contribuir para elevar ainda mais a inflação dos próximos meses.

— Os grupos Alimentação e Bebidas e Transportes são os que mais pesam no IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), acima de 20% cada.

Sob o ponto de vista ambiental, destaca Girardello, a irrigação exerce um importante papel, pois é a única forma de aumentar a produção sem expandir o plantio em novas áreas. E tem atuação direta na melhora do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) nas populações de regiões mais carentes.

Um exemplo é o que acontece no Vale do São Francisco. Os municípios limítrofes de Juazeiro (BA) e Petrolina (PE) aumentaram em 70% o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em uma década, graças à agricultura irrigada.

Produção: ‘Bolhas de riqueza’ no Oeste da Bahia mostram como agronegócio torna regiões do interior do país imunes à crise

— As chuvas são sempre incertas e não há um planejamento adequado, para evitar problemas no uso da água. Você pode até ficar sem energia, mas sem alimentos e água não dá —afirma Lineu Neiva Rodrigues, chefe-adjunto de pesquisas da Embrapa.

Rodrigues lembra que o país ainda é muito dependente de hidrelétricas e precisa investir mais em outras fontes de energia, como a eólica e a solar, principalmente no eixo mais urbanizado do Brasil, que é o grande afetado pelo problema.

Ele explica que a falta de chuvas e a queda dos reservatórios atingem, principalmente, a Bacia do Paraná, que abastece a região Centro-Sul do país:

1 de 6

Foto Anterior Proxima Foto

— A agricultura já começa a ser atingida, e hidrovias importantes para o escoamento da safra podem ser seriamente prejudicadas.

Miguel Oliveira, diretor do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), diz que ainda há um período longo de seca para enfrentar.

ONS: Operador pede a todas as usinas do país que suspendam paradas de manutenção no segundo semestre

— Não dá para saber agora como ficará a agricultura irrigada, mas a produção agrícola pode ser afetada. Nosso problema é saber quando começará a chover e qual a quantidade de chuva.

Melhoria de barragens

Produtora rural de soja, milho, sorgo, feijão irrigado e gado para corte em Paracatu (MG), Rowena Petroll aprendeu com a crise de 2017. A falta de água impediu o plantio de culturas de inverno e seu faturamento caiu a um quarto do que recebia.

— De lá para cá, melhoramos a estrutura para a reserva de água disponível e fizemos melhorias na estrutura de barragens, mas muitos produtores estão preocupados, pois não fizeram esse investimento.

(Colaborou Stephanie Tondo)

Crise hídrica ameaça safras de culturas irrigadas – Fazrnda dois irmãos (Foto: Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo)

Lago da represa da hidrelétrica de Marimbondo, no interior de São Paulo, praticamente sem água: consumidor terá de pagar sobretaxa ainda maior na conta de luz pelo acionamento de termelétricas (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

A usina hidrelétrica de Marimbondo esta operando abaixo da capacidade por causa do período da estiagem (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

Seca pode prejudicar fornecimento de energia elétrica (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

Segundo ONS, está prevista “a perda do controle hidráulico de reservatórios da bacia do Rio Paraná no segundo semestre de 2021” (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

O reservatório da usina Marimbondo, localizado no Rio Grande, divisa entre São Paulo e Minas Gerais, atingiu o nível mais baixo entre todos os monitorados pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

Com a falta de chuva para encher o reservatorio, a producao de energia foi reduzida (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

Área inundada por barragem volta a ficar exposta devido à seca histórica (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

Cor mais vívida do solo revela o que há pouco era o fundo do reservatório (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

Localizada na divisa de São Paulo e Minas Gerais, a hidrelétrica tem capacidade para produzir 1.440 megawatts (Foto: Foto: Ferdinando Ramos / Agência O Globo)

Para economizar, ligue o aparelho apenas quando for dormir e desligue logo ao acordar. Uma opção é usar a função sleep, disponível em alguns modelos. Outro cuidado é manter o ar-condicionado em temperatura adequada. Especialistas recomendam 23ºC. Não é preciso colocar temperatura muito baixa, para não gastar muita energia. (Foto: Foto: Pixabay)

Em uma família com quatro pessoas, o uso do chuveiro elétrico corresponde a cerca de 25% da conta de luz. Para economizar, evite banhos muito longos e dê preferência a usar o chuveiro no modo verão, que economiza até 30% de energia (Foto: Foto: Pixabay)

Quando a porta fica muito tempo aberta, o motor funcionará mais, gastando mais energia. É importante também manter a borracha de vedação da porta da geladeira em bom estado. Ao viajar, uma opção é esvaziar a geladeira e desligá-la da tomada. (Foto: Foto: Pixabay)

A substituição de lâmpadas incandescentes pelas de LED pode gerar uma redução de 75% a 85% no consumo de energia. Além disso, essas lâmpadas duram mais. Em relação às lâmpadas fluorescentes, a economia é de cerca de 40% (Foto: Foto: Pixabay)

Dê preferência a lavar uma grande quantidade de roupas, para economizar água e energia. Evite colocar muito sabão, para não ter de enxaguar duas vezes. Na hora de passar, a melhor opção é juntar roupas e passar uma grande quantidade de uma vez. Desligue o ferro quando for interromper o serviço. Use a temperatura indicada para cada tipo de tecido e comece pelas roupas mais leves. (Foto: Foto: Pixabay)

O uso do ventilador de teto durante 8 horas por dia gera um gasto de apenas R$ 18 por mês. Mesmo assim, é importante evitar deixar o aparelho ligado quando não houver ninguém no cômodo. Na hora de comprar, lembre-se que quanto maior o diâmetro das hélices, maior o consumo de energia. (Foto: Foto: Pixabay)

No caso dos eletrônicos, a recomendação é desligar o televisor e os videogames quando ninguém tiver usando. Retirar os aparelhos da tomada também ajuda a poupar energia. (Foto: Foto: Arquivo)

Usina Hidrelétrica binacional de Itaipu. A maior do mundo desde a inauguração, em 1984, até o ano de 2012, produz até 14.000 megawatts (Foto: Foto: Alan Santos / PR)

Vista aérea da usina de Belo Monte, a segunda maior do país: capacidade para 11.233 megawatts (Foto: Foto: Agência O Globo)

(Foto: )

Casa de força e vertedouro da usina hidrelétrica de Jirau, no rio Madeira, em Rondônia. Com capacidade instalada de 3.750 megawatts, ela está em operação no Rio Madeira, na Bacia Amazônica, desde 2013 (Foto: Foto: Agência O Globo)

No mersmo Rio Madeira, está a Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, instalada no rio Madeira, em Porto Velho (RO). Ela tem capacidade para 3.568 MW (Foto: Foto: Divulgação / Ibama)

Hiderlétrica Ilha Solteira, em São Paulo.Em operação desde 1973 (Foto: Foto: Henrique Manreza / Manreza Imagens / Divulgação / CTG Brasil)