Especialistas defendem isonomia tributária para desenvolver setor de energia solar

16/12/19 | São Paulo

Jornal do Senado

Promover a isonomia tributária e a atualização dos anexos do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores e Displays (Padis) foram os principais pontos defendidos pelos especialistas que participaram de audiência pública, na quarta-feira (11), na Comissão de Fiscalização e Controle (CTFC). O debate foi sugerido pelo presidente do colegiado, senador Rodrigo Cunha (PSDB-AL), com o objetivo de identificar os entraves para que as empresas nacionais, mesmo com o deferimento para o Padis, não consigam, na prática, se beneficiar dos incentivos fiscais federais concedidos para a produção de módulos/painéis solares.

Criado em 2014, o Padis reduz a zero as alíquotas de PIS, Cofins, Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Importação (II) incidentes na importação de máquinas, aparelhos, instrumentos, equipamentos, para incorporação ao ativo imobilizado da adquirente, ferramentas computacionais (softwares) e dos insumos empregados na produção dos módulos fotovoltaicos. Entretanto, muitos fabricantes nacionais reclamam de não estarem sendo beneficiados já que, atualmente, os módulos importados têm isenção de IPI e Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), além de PIS/Cofins, enquanto as empresas nacionais são tributadas ao adquirir suas matérias-primas, pagando II, IPI, PIS/Cofins e ICMS, o que vem prejudicando, na avaliação dos debatedores, a competitividade nacional.

O diretor do Grupo Setorial de Módulos Fotovoltaicos da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), que reúne mais de 500 associados, Adalberto Maluf, explicou que, em 2016, houve a promessa do governo de um tripé de desenvolvimento do setor de energia solar fotovoltaica. Entre os incentivos para atrair empresas que investissem em produção em escala no Brasil estavam a oferta de leilões para gerar demanda; a criação de uma política de conteúdo local com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), financiando módulos que cumprissem os requisitos de nacionalização; e instrumentos para resolver os problemas da indústria como a isonomia tributária.

De acordo com ele, em 2016 foram feitos os primeiros leilões, e as empresas conseguiram se instalar e crescer. Entretanto, em 2017, teve início a quebra de promessas. Segundo ele, o Banco do Nordeste (BNB) começou a financiar a aquisição de módulos importados com taxas melhores que as nacionais, os anexos dos insumos que fazem parte do Padis não foram atualizados e a isonomia tributária para a indústria local não foi concretizada, gerando insegurança jurídica para o setor.

— Basicamente o Padis é um bom programa. Ele atrai investimentos com contrapartida de desenvolvimento de pesquisa no Brasil, porém ele não atualizou os anexos dos insumos que estão dentro do Padis. Então a gente é obrigado a pagar os 5% de investimento de faturamento em pesquisa e desenvolvimento, que é legal e acho que o setor gosta disso, de desenvolver tecnologia aqui. A gente tem reservas minerais que poderiam nos colocar como líder das energias limpas, de eletromobilidade, em todas essas tecnologias do futuro, mas infelizmente, isso não se resolveu. Embora o Ministério da Indústria e o Ministério de Ciência e Tecnologia tenham assinado isso ainda em 2018, isso está parado no Ministério da Economia desde o final de 2018 e infelizmente, o programa ainda é um programa com pouca eficácia — disse. 

 
O presidente executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR), Rodrigo Sauaia, informou que, dos 11 milhões de empregos renováveis no mundo, a energia solar fotovoltaica representa um terço desse total, sendo 20% concentrados na fabricação industrial. Além de grande gerador de empregos e de estimular o desenvolvimento de pesquisa e tecnologia no país, como têm feito as fabricantes já instaladas, segundo Rodrigo, é preciso que o governo avance nos incentivos aos elos da cadeia produtiva, principalmente aos módulos fotovoltaicos. Para ele, o desequilíbrio tributário é o maior entrave para o crescimento da indústria. Entretanto, defendeu que o governo não trabalhe com uma ótica intervencionista e protecionista e sim, sob uma ótica de competitividade e livre concorrência para que os fabricantes brasileiros de equipamentos fotovoltaicos possam atender não só o território nacional, mas também o mercado de países vizinhos.
— Que possamos trazer isonomia para o tratamento tributário dado a equipamentos nacionais frente ao setor fotovoltaico com os equipamentos internacionais, e o caminho não é aumentar impostos sobre o setor. Essa seria a solução errada. O caminho é sim nós buscarmos uma forma de incluir corretamente no Padis os equipamentos fotovoltaicos que estão previstos, mas cujas as matérias-primas foram deixadas de fora. É preciso atualizar isso frente à realidade do setor e dos seus equipamentos e componentes, incluindo os insumos produtivos e os equipamentos dos módulos fotovoltaicos. Temos aqui a oportunidade de incluir os insumos de células fotovoltaicas e abrir espaço para que o Brasil possa sim adentrar nesse elo da cadeia produtiva também — afirmou.

PL 4.805/2019

Apesar de o Brasil ser rico em fontes renováveis de energia, como observou o presidente da comissão, Rodrigo Cunha, apenas 1,2% da nossa matriz energética provém da luz do sol. Ela é apenas a sétima fonte de geração de eletricidade no país. Mesmo já tendo uma política pública para incentivar a instalação de painéis solares, o Padis, o senador disse que é preciso respostas concretas do governo para identificar os gargalos que impossibilitam o desenvolvimento do setor, além de ações para mudar o cenário, como a votação do projeto de lei (PL) 4.805/2019, em tramitação no Senado, que dispõe sobre a política industrial para o setor de tecnologia da informação e comunicação, bem como para semicondutores.

— Essa é uma questão que não pode deixar de ser respondida. Afinal, não nos falta sol. Essa energia é limpa e renovável e ainda gera empregos. Mas, com tudo isso, o uso da energia solar não decola por aqui. Então, onde está o problema? Suspeito que parte da resposta esteja justamente no aperfeiçoamento do próprio Padis. Tomamos conhecimento de empresas credenciadas no programa, mas que, na prática, ainda não gozam de benefícios fiscais correspondentes. Além de todo o investimento, da expectativa que foi criada, se cria uma insegurança para novos investimentos e uma dificuldade de manutenção daqueles que já foram feitos — observou.

O analista de comércio exterior da Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, José Ricardo Ramos Sales, afirmou que o mundo caminha cada vez mais para se tornar renovável, estando o Brasil entre os cinco países que mais criam empregos com esse tipo de geração energia. O aumento da importação das células e módulos fotovoltaicos, segundo ele, também tem preocupado o governo e por isso a linha de defesa do Ministério da Economia é no sentido de contornar o problema com a atualização do Padis e seus anexos, segundo o que determina a Organização Mundial do Comércio (OMC), com a votação do PL 4.805/2019.

— Se a gente consegue contornar essas distorções tributárias, a gente imagina trazer de forma competitiva, sustentável, essa indústria fotovoltaica para o Brasil e retomar os investimentos atualmente parados. E trazer vários outros fabricantes para cá, nacionais ou estrangeiros, que vão poder gerar empregos em diversos setores industriais nas diversas áreas de atuação — defendeu.

O coordenador-geral de Estímulo ao Desenvolvimento de Negócios Inovadores da Secretaria de Empreendedorismo e Inovação do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Henrique de Oliveira Miguel, ressaltou que a atuação em duas frentes pode trazer melhorias ao cenário. A pasta, conforme o secretário, está de acordo com a atualização do Padis e, inclusive, já elaborou com outros ministérios e com o setor empresarial a redação final para tal finalidade. Outra iniciativa defendida pelo MCTIC é também a aprovação do PL 4.805/2019, que segundo ele, precisa ser votado ainda este ano em razão da condenação imposta ao Brasil pela OMC. O projeto traz um novo modelo de incentivos fiscais para empresas de tecnologia da informação e comunicação e de semicondutores, bem como de investimento em pesquisa e desenvolvimento nesses setores e que precisam ser aplicados a partir de 2020.

— Temos a expectativa de votação do PL pelo Senado Federal (…). Daí nós precisaremos fazer um novo decreto, e a oportunidade para a inclusão das alterações nos anexos do Padis surge de uma forma concreta. E os itens identificados, já temos a redação final desses anexos. Já discutimos bastante com o setor privado e intragoverno com o apoio do Ministério de Minas e Energia — informou.

Leilões

Para o diretor do Departamento de Informações e Estudos Energéticos do Ministério de Minas e Energia, André Luiz Rodrigues Osório, há necessidade de melhorias no que tange ao financiamento do setor de energia solar fotovoltaica, além de uma política industrial que objetive esse crescimento.

Na sua avaliação, o potencial energético solar do Brasil o colocará entre os dez maiores mercados mundiais, e o Ministério de Minas e Energia tem atuado estrategicamente com a promoção dos leilões.

— Nós temos uma série de leilões programados. O próximo será dia 30 de abril de 2020, o A-4. Nós tivemos o A-6, com 11 empreendimentos contemplados — citou.

Além dos leilões, ele disse que o país precisa se preparar para uma matriz com grande percentual de geração variável e manter a fonte de energia solar cada vez mais competitiva para que a indústria possa se desenvolver e o consumidor tenha preço acessível e serviço de qualidade.

— A fotovoltaica precisa se adequar a esse desafio de mostrar que esse modelo vai permanecer competitivo com o novo marco do setor elétrico, que o governo vem trabalhando, garantir a qualidade das instalações e aumentar a sua vida útil. Sabemos que é uma tecnologia robusta, bastante madura, no entanto, a pressão por preços cada vez menores pode reduzir a qualidade dos equipamentos e instalações — acrescentou.

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