Indústria solar: esperança na continuidade da contratação

09/02/15 | São Paulo

Indústria solar: esperança na continuidade da contratação

Fonte:CanalEnergia

Após LER 2014, setor quer contratação constante nos leilões para que a cadeia industrial tenha estabilidade para se instalar no país

Realizado em 31 de outubro de 2014, o Leilão de Energia de Reserva que marcou a contratação pela primeira vez de projetos solares fotovoltaicos, também significou a largada para a instalação da cadeia industrial da fonte no país. Foram 1.048 MW contratados em usinas espalhadas pelos estados da Bahia, São Paulo e Pernambuco. Há a expectativa do governo e de agentes do setor que a fonte consiga repetir o êxito da energia eólica, que conseguiu atrair os principais fabricantes mundiais de aerogeradores e da cadeia eólica.
De acordo com Rodrigo Sauaia, presidente da Associação Brasileira de Energia Solar, a contratação no leilão foi importante, porque sinalizou um volume de demanda que pode atrair essa cadeia para o Brasil. Mas apesar do desempenho da fonte no LER, um certame apenas ainda não é capaz de seduzir os fabricantes para investirem no Brasil. O mercado pede uma previsibilidade de contratação que justifique a sua vinda para o país. Nas contas da ABSOLAR, 1 GW por ano seria um montante ideal para que a cadeia se estabeleça. De acordo com Markus Vlasits, gerente da Yingli Solar para o Brasil, é preciso que se tenha certeza que o LER não foi um acontecimento isolado. Segundo ele, uma fábrica pode precisar de até seis anos para se amortizar. "Você não coloca uma fábrica em um outro país para produzir 200 MW ou 300 MW e depois fechar", avisa.

Quem também associa a constância na contratação ao desenvolvimento da cadeia industrial solar é Leônidas Andrade, coordenador do grupo setorial fotovoltaico da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica. Ele vê movimentações de mercado após o leilão do ano passado, mas quer sinais mais fortes do governo nessa direção, como o número de leilões que vão ter usinas solares.

"Mais importante que o leilão do ano passado é a indústria começar a entender que vai começar a ter uma continuidade desses projetos", explica. Para um fabricante, quanto mais possibilidade de contratação, mais garantia de fechar negócios ele tem. A fabricação de módulos exige um alto investimento que não suportaria interrupções na demanda. "Leilão de Reserva sinalizou demanda" Rodrigo Sauaia, da ABSOLAR.

Desde o leilão foram intensificadas as conversas entre empreendedores vencedores e os fabricantes, que já vinham acontecendo. No fim do ano passado, a Renova Energia e a SunEdison saíram na frente e anunciaram a criação de uma joint venture para o desenvolvimento de 1 GW de projetos. O investimento será de US$ 30 milhões para duas fábricas e as plantas deverão iniciar a operação em 2016 . Serão módulos monocristalinos e de potência nominalde 360 W por módulo. Os 106 MWp negociados no LER 2014 vão fazer parte da carteira da joint venture. Ela foi criada com o objetivo de ser o veículo exclusivo das duas empresa para a comercialização e operação de projetos solares no Brasil. Os projetos negociados atendem os requsitos do BNDES. Um dos maiores players do país na fonte eólica, a intenção da Renova é se tornar com a associação mais competitiva nos próximos leilões. Já a SunEdison confia na sua expertise de já ter participado de vários projetos ao redor do mundo para entrar no mercado brasileiro. A SunEdison aponta o Brasil como um dos principais pilares de crescimento da companhia nos próximos anos. Ela poderá negociar com outros clientes no país. Parcerias similares entre outros players estão sendo cogitadas pelo mercado. De um lado, há o empreendedor com a sua carteira de projetos e do outro, o fabricante que ganha a certeza do contrato de fornecimento.No início do ano, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social anunciou a aprovação de financiamento de R$ 26 milhões para a Pure Energy construir em Marechal Deodoro (AL) a primeira fábrica de painéis fotovoltaicos do Brasil. Segundo Gelson Cerutti,diretor da empresa, os planos são que a produção da fábrica comece no fim de 2015. O financiamento do projeto veio no âmbito do  plano Inova Energia e foi a primeira aprovação do banco para um projeto que contempla a cadeia industrial da fonte. Existe a previsão da nacionalização de componentes dos painéis em projeto de desenvolvimento feitos em parcerias com outras empresas brasileiras.

"A energia solar já é uma energia pronta na Europa. O que estamos fazendo é uma transferência de know-how para o Brasil", comenta Cerutti.
Das despesas gerais do projeto, R$ 11,9 milhões serão financiados pela linha de financiamento do BNDES Fundo Clima – Subprograma Energias Renováveis e R$ 4,6 milhões dos gastos em Inovação pelo Fundo Clima – Subprograma Projetos Inovadores. Já com equipamentos, o gasto será de R$ 1,7 milhão financiados pelo Programa BNDES de Sustentação do Investimento. Os componentes importados que não tem similar nacional terão R$ 7,5 milhões de financiamento.

"2015 será decisivo para fechar contratos" Helena Chung, da Bloomberg New Energy Finance
No plano de nacionalização de componentes, o governo pretende que até 2020 os módulos fotovoltaicos já estejam sendo montados no país. Caixa de junção, células e inversores são componentes que deverão entrar em linha de montagem nacional. Considerando como engessadas as regras de financiamento do BNDES, Leônidas Andrade, da Abinee, lembra que conversas entre o banco e representantes do setor trouxeram adequações importantes ao modelo planejado pelo BNDES, como o prazo de fabricação de células fotovoltaicas no país para 2020 – a ideia inicial era 2018 – dando condições. "Essa obrigatoriedade não serviria como incentivo ao setor, muito pelo contrário, o timing era curto demais", explica.

A meta é considerada como possível para Helena Chung, analista de energia solar para o Brasil da Bloomberg New Energy Finance.
Mas o mercado global e a demanda serão preponderantes. Ela elogia os últimas decisões da EPE, que aumentaram a previsão de contratação. Para ela, deram mais segurança para a viabilização da fonte. “Se o governo anunciar que o leilão de reserva de todo ano vai ter solar já ajuda”, afirma. A complexidade da cadeia industrial solar não está na fabricação dos módulos e sim na dos seus nos componentes, como back sheets, vidros e frames. A fabricação de algumas dessas peças está centralizada em países que já tem uma indústria ativa. O conteúdo local, um dos requisitos do BNDES para a concessão do financiamento, também é visto por uma parcela do mercado como uma espécie de complicador no desenvolvimento dos projetos, já que por conta dessa obrigatoriedade, haverá a necessidade de alongamento de cronogramas de entregas devido a instalação das fábricas.

"Indústria precisa ter continuidade de contratações" Leônidas Andrade, da Abinee.
Exceto pela associação da Renova/SunEdison, o silêncio tem imperado e os anúncios ainda não aconteceram. Mesmo os vencedores do leilão solar do governo de Pernambuco, realizado no fim de 2013, não divulgaram seus fornecedores nem suas estratégias de implantação. Durante o ano de 2014, os fabricantes pediam escala e mais contratação para se instalem no estado. Um dos objetivos desse certame era o de trazer a cadeia industrial para o estado como parte de uma politica de atração de investimentos. O êxito no LER fez com que não fosse necessário um novo leilão.

Outro aspecto colocado como desafio para os fabricantes está nos tributos que incidem sobre essa cadeia. Segundo Vlasits, da Yingli, a taxa de importação de um painel montado é de 12%, mas se os componentes desse painel forem importados separadamente, a somatório das cargas tributárias será maior que o do painel montado. "Os problemas estão nos detalhes, não no aspecto operacional", diz ele. Também negociando com os vencedores do último leilão, o executivo espera que esse ano conseguir anunciar a expansão da empresa chinesa para o Brasil.

Aspectos burocráticos no modelo de financiamento elaborado pelo BNDES geram dúvidas nos empreendedores. Há incertezas na aprovação do enquadramento do projeto, que só pode receber o aval após todo os produtos selecionados obterem o código Finame.
Porém o fabricante só vai poder ter esse código quando a sua fábrica estiver pronta, podendo ocorrer descasamento nos prazos para recebimento do financiamento para implantação da usina.

"Fábrica deve começar a produzir no fim de 2015" Gelson Cerutti, da Pure Energy.
Um importante aliado no deslanche da cadeia solar pode ser o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores. Esse plano permite a importação de equipamentos para a incorporação ao ativo imobilizado com as alíquotas de PIS, Cofins e IPI em troca de investimentos em Pesquisa & Desenvolvimento.
A microgeração, já autorizada pela Agência Nacional de Energia Elétrica, mas ainda com ínfima penetração no país, poderá ser uma das maiores beneficiadas com o deslanche da cadeia industrial solar no país. Os fabricantes também mostram interesse em investir nesse filão, de olho na situação de limite do sistema elétrico brasileiro, em que um racionamento de energia é aparente. Com uma tendência de diminuição de preço nos próximos anos ela deixaria de ficar restrita ao consumidor de poder aquisitivo mais alto.

Segundo Leônidas Gonçalves, da Abinee, em alguns países o grande impulso da energia solar veio com a demanda da microgeração. Para Rodrigo Sauaia, da ABSOLAR, apesar do crescimento da geração distribuída ser mais lento que o da centralizada, ela tende a ser mais constante.
A localização dessas fábricas deverá ser ditada pelos incentivos fiscais oferecidos pelos estados. A possibilidade de que se repita o que aconteceu com os fabricantes de aerogeradores e o Nordeste os receba existe. Porém, fatores que pesavam, como a logística e a proximidade das usinas não terão o mesmo impacto, uma vez que os equipamentos solares não tem a complexidade de pás e torres eólicas. "É claro que o estados vão tentar atrair, como Pernambuco fez com seu leilão, mas a indústria vai buscar as facilidades de terem os conceitos governamentais", observa Leônidas Andrade.

"LER 2014 não deve ser acontecimento isolado" Markus Vlasits, da Yingli Solar.
Se em 2014 a pergunta era se haveria contratação solar, o ano de 2015 é considerado como chave para o desenvolvimento da cadeia industrial fotovoltaica no país. Com prazo de entrega para 2017, é esperado que até dezembro os empreendedores já estejam com as negociações fechadas para que haja tempo hábil de instalação da fábrica e de início da produção. "Esse ano vamos saber se oleilão foi um sucesso ou não. É quando vamos descobrir se os projetos vão conseguir equipamentos e de onde os empreendedoresvão conseguir esse equipamento", aponta Helena Chung, da Bloomberg.