Sistemas híbridos solar-diesel

01/05/21 | São Paulo

Reportagem publicada no Canal Solar


Sistemas híbridos de energia são aqueles que empregam múltiplas fontes de energia. Essa denominação também tem sido adotada para sistemas que possuem bancos de baterias associados a outras fontes como a solar fotovoltaica e…

Sistemas híbridos de energia são aqueles que empregam múltiplas fontes de energia. Essa denominação também tem sido adotada para sistemas que possuem bancos de baterias associados a outras fontes como a solar fotovoltaica e a eólica.

Neste artigo vamos abordar um tipo de sistema híbrido que emprega duas fontes: geração a diesel (ou geração a combustão, de uma forma genérica) e geração solar fotovoltaica.

A combinação solar-diesel é vantajosa à medida que proporciona um modo confiável de alimentação isolada sem o uso intensivo de combustível fóssil. Em locais já atendidos por geradores a diesel a adição de sistemas fotovoltaicos com operação em paralelismo tem o efeito de reduzir o custo com combustível, além de acrescentar confiabilidade e reforçar a autonomia da alimentação das cargas consumidoras.

A figura a seguir ilustra um sistema fotovoltaico convencional, no qual o inversor é conectado a um ponto qualquer da instalação, podendo ser ligado indistintamente próximo à cabine de entrada ou a algum quadro de distribuição interno do consumidor.

A Figura 2 ilustra a situação que normalmente ocorre em consumidores que possuem geração a diesel como backup ou para uso em horários de ponta e desejam acrescentar geração fotovoltaica.

O sistema fotovoltaico nesses casos é acrescentado antes do quadro de transferência automática (QTA). A função deste quadro é realizar o intertravamento entre a rede elétrica pública e o gerador a diesel, além de fazer a mudança automática da posição da chave, transferindo a fonte diesel para as cargas consumidoras quando a rede elétrica estiver ausente.

Neste tipo de configuração o sistema fotovoltaico opera apenas enquanto a rede elétrica estiver presente. Em caso de falha, quando a geração a diesel entra em operação, o sistema fotovoltaico é desligado.

As Figuras 1 e 2 ilustram o funcionamento do QTA. Na figura 1 a rede elétrica está presente e a chave encontra-se na posição correspondente ao uso da rede. A Figura 2 ilustra a situação em que a rede falha e a alimentação das cargas é transferida para o gerador a diesel. Neste último caso a rede elétrica e o sistema fotovoltaico estão completamente desconectados da instalação.

As Figuras 4 e 5 ilustram uma outra possibilidade para a conexão de sistemas fotovoltaicos a consumidores equipados com geração a diesel. Observe-se que neste caso o inversor é conectado após o QTA. Se houver falha da alimentação pública o inversor deixará de operar em paralelismo com a rede e passará a operar em paralelismo com o gerador a diesel – esta última situação é ilustrada na Figura 5.

A conexão do sistema fotovoltaico depois do QTA pode ter duas vantagens principais. A primeira delas, muito simples, é permitir a conexão do sistema fotovoltaico em qualquer ponto da instalação, sem a necessidade de conexão antes do QTA.

Isso pode permitir, por exemplo, que um sistema fotovoltaico seja conectado a um quadro de distribuição interno do consumidor, enquanto o gerador a diesel está localizado mais distante, próximo à cabine de entrada. Em algumas situações pode ser onerosa a conexão do sistema fotovoltaico junto à cabine de entrada e é preferível a conexão dos inversores o mais próximo possível das cargas consumidoras e também dos painéis solares.

A segunda vantagem da estratégia de conexão ilustrada nas Figuras 4 e 5 (sistema fotovoltaico após o QTA) é permitir a continuidade da operação do sistema fotovoltaico mesmo quando o consumidor é alimentado pelo gerador a diesel.

A fonte diesel neste caso simplesmente substitui a rede elétrica, sendo responsável pela alimentação de tensão alternada. O inversor fotovoltaico conecta-se à alimentação do gerador a diesel da mesma forma que seria conectado à alimentação da rede elétrica externa.

A vantagem óbvia deste modo de conexão é permitir o uso da energia fotovoltaica, economizando combustível. Além da economia, isso permite aumentar a autonomia do sistema.

A combinação parece perfeita, mas há algumas complicações neste tipo de ligação. Primeiramente, se desejarmos que o sistema fotovoltaico opere em paralelismo com o gerador a diesel será necessário alterar as configurações do inversor.

A qualidade da alimentação elétrica da rede externa e a qualidade da alimentação do gerador a diesel são diferentes. O gerador a diesel pode oferecer faixas de variação de tensão e de frequência mais amplas do que as encontradas na rede elétrica pública. O inversor deve então ser parametrizado corretamente para operar em paralelo com o gerador, evitando-se seu desligamento por sobre/sub-frequência ou sobre/sub-tensão.

O segundo problema encontrado no paralelismo entre sistema fotovoltaico e gerador a diesel é o retorno de energia excedente, situação ilustrada na Figura 6. Diferentemente da rede elétrica externa, o gerador a diesel não é capaz de absorver o excedente de energia do sistema fotovoltaico. Isso significa que a potência da geração solar nunca pode ser superior à potência da carga.

A combinação de geração fotovoltaica e a diesel em paralelismo não é complicada, mas requer soluções tecnológicas para vencer os desafios comentados acima. Em resumo, é preciso parametrizar o inversor conforme a fonte à qual ele se conecta (rede externa ou diesel) e evitar que ocorra excedente de energia fotovoltaica.

Existe ainda uma outra preocupação quando conectamos um sistema fotovoltaico em paralelo com um gerador a diesel. É necessário respeitar as características operacionais do gerador, mantendo-o sempre em rotação constante e operando com um valor mínimo de potência. Isso é necessário para garantir uma boa eficiência do gerador, além de prolongar sua vida útil.

Tipicamente a carga mínima dos geradores a diesel equivale a 30% da sua potência nominal. Geradores a diesel com baixa carga tornam-se pouco eficientes e ficam sujeitos a diversos fenômenos que podem danificá-los ou reduzir consideravelmente sua vida útil. Os motores a combustão são projetados para trabalhar sempre o mais próximo possível de sua carga nominal e a operação em baixa carga deve ser evitada.

Então, mesmo que exista disponibilidade de geração solar e toda a carga possa ser alimentada pelo sistema fotovoltaico, a geração a diesel não pode ser reduzida abaixo de um valor mínimo. Isso exige um sincronismo entre o sistema fotovoltaico e o gerador a e diesel para eventualmente reduzir a geração solar quando a geração a diesel atingir seu limiar inferior.

Resumidamente, pelas razões explicadas acima, será sempre necessário utilizar pelo menos 30% da potência máxima do gerador a diesel mesmo que exista energia solar disponível.

A seguir vamos analisar três estratégias que podem ser empregadas nos sistemas híbridos que combinam gerador a diesel e sistema fotovoltaico. Em qualquer dos casos o inversor deve estar equipado com uma interface de comunicação que possua portas digitais para sinalização e/ou interfaces de comunicação RS 485 ou equivalentes, dependendo da complexidade do controle que será realizado. A Figura 8 ilustra o módulo de comunicação dos inversores da fabricante SolarEdge.

Esta é uma função simples que pode ser utilizada apenas para desconectar o sistema fotovoltaico quando a geração a diesel está ativa. Neste caso o sistema fotovoltaico é desligado e não opera em paralelismo com o gerador a diesel.

Isto não é o que podemos chamar exatamente de sistema híbrido, mas esta estratégia de operação poder ser útil para consumidores que usam o diesel apenas para backup ou em pequenos intervalos do dia – por exemplo, no horário de pico – e ao mesmo tempo desejam ter o sistema fotovoltaico instalado após o QTA.

Em outras palavras, as fontes diesel e solar compartilham o mesmo barramento de corrente alternada, mas nunca operam simultaneamente. O gerador é acionado poucas vezes e por curtos intervalos de tempo e as cargas podem ser atendidas totalmente pela geração a diesel, podendo-se dispensar a geração fotovoltaica nesses curtos intervalos de tempo.

Por que não deixar o sistema fotovoltaico operar em paralelismo com o gerador a diesel? A resposta é que o cliente não deseja adicionar essa complexidade à sua instalação e pode dispensar a geração solar nos raros momentos em que o gerador a diesel é acionado.

Esta estratégia de operação pode ser implementada, tomando-se como exemplo um inversor da fabricante SolarEdge, através da conexão de uma chave normal fechada (NF) à placa de comunicação do inversor. O inversor precisa estar equipado com um módulo de comunicação e deve ter uma entrada de comunicação denominada power reduction interface (PRI) – interface de redução de potência. Isso é ilustrado na Figura 9.

O modo de desconexão do sistema fotovoltaico é um método de controle simples que permite sinalizar ao inversor a presença ou a ausência do gerador a diesel, realizando um intertravamento entre essas duas fontes.

Isso evita a necessidade de instalação do sistema FV antes do QTA, sendo possível colocá-lo próximo às cargas ou mesmo próximo ao gerador a diesel. É um detalhe que parece simples, mas pode ter impacto no custo da instalação elétrica necessária para a conexão do sistema fotovoltaico.

A função desse modo de operação é apenas desligar o sistema fotovoltaico quando o gerador a diesel entra em operação, sem nenhum tipo de controle mais sofisticado. Naturalmente, neste caso a geração FV e a geração a diesel nunca ocorrerão simultaneamente.

Este modo de operação é recomendado em aplicações em que o gerador a diesel é utilizado apenas para backup, não sendo acionado com muita frequência.

Não se justificaria nesta situação a adição de um sistema mais complexo para o controle do sistema fotovoltaico, tendo em vista que o gerador a diesel é capaz de suprir toda a carga durante a falta da rede elétrica – e isto ocorre por um tempo não muito prolongado.

Quando falta de energia cessar, com o restabelecimento da alimentação da rede elétrica pública, o gerador a diesel se desliga e o contato sinalizador é fechado, permitindo a reconexão do sistema fotovoltaico.

A Figura 12 ilustra como deve ser parametrizado o inversor para trabalhar neste modo. Uma porta de E/S de uso geral (GPIO) deve ser configurada para receber os contatos de um relê com chave do tipo NF. O sistema entende que o inversor pode operar quando a porta GPIO está em nível baixo (contato do relê fechado) e entende que o inversor deve desligar-se quando a GPIO está em nível alto (chave do relê aberta) – conforme ilustram as Figuras 10 e 11.

Neste modo de operação é possível alimentar simultaneamente as cargas consumidoras pelo gerador a diesel e pela fonte solar. Novamente, como no caso anterior, um relê de sinalização é ligado à porta GPIO. Neste caso, todavia, emprega-se um contato normal aberto (NA), conforme ilustra a Figura 13.

A principal diferença entre este modo de operação e o anterior é que o sistema fotovoltaico estará sempre em operação, seja em paralelismo com a rede elétrica ou em paralelismo com o gerador a diesel.

Conforme ilustra a Figura 13, o esquema de ligação para o modo de paralelismo com gerador emprega um contato normal aberto (NA) do painel do gerador a diesel. O contato fica aberto quando a rede CA está presente e o gerador está desligado, sinalizando para o inversor que ele deve operar normalmente no modo de conexão à rede, como qualquer outro inversor do tipo grid-tie.

Quando a rede pública se desliga o contato é fechado, sinalizando ao inversor que agora ele irá operar em paralelismo com o gerador a diesel. Neste caso o gerador a diesel será a fonte principal de alimentação, substituindo a rede elétrica. O inversor fotovoltaico deverá seguir a referência de tensão do gerador e estar preparado para operar de forma sincronizada.

Em resumo, com a chave na posição fechada o inversor vai entender que não está mais operando com a rede elétrica da concessionária e precisa mudar o seu comportamento para operar em paralelismo com o gerador a diesel. O sistema diesel-solar constitui neste caso o que chamamos de microrrede, que é uma rede autônoma que opera de forma ilhada, desconectada da rede elétrica pública, com suas próprias fontes de energia.

Para que o inversor seja capaz de operar neste modo com duas opções (conectado à rede ou conectado ao gerador a diesel) é necessário parametrizá-lo para que ele entenda os sinais recebidos na porta GPIO e principalmente para que o inversor altere seu comportamento de acordo com a fonte principal presente (rede ou gerador).

A Figura 15 mostra como é feita a configuração da porta GPIO do inversor SolarEdge para entender os sinais do relê com chave NA neste modo de operação.

Em seguida configuramos os modos de controle de potência, conforme ilustram as Figuras 16 e 17. Existem dois modos que podem ser empregados: potência x frequência ou potência x tensão. Esses modos de operação já são pré-configurados no inversor, mas podem ser parametrizados de acordo com cada aplicação.

O modo de controle de potência x frequência é mais recomendado quando se faz a operação do inversor em paralelo com uma máquina rotativa. As máquinas rotativas têm sua frequência de rotação alterada conforme a carga. O aumento da potência consumida do gerador faz sua frequência de saída diminuir. Contrariamente, a redução da potência causa a elevação da frequência.

Este comportamento natural do gerador pode ser utilizado como um sinal de controle para o inversor. A diminuição da frequência sinaliza que o gerador está muito carregado, portanto é desejável ter geração solar para reduzir a carga do gerador.

Por outro lado, o aumento da frequência sinaliza que existe excesso de potência no sistema e o gerador trabalha com pouca carga, indicando que a potência do sistema fotovoltaico deve ser reduzida a fim de evitar excedente de energia no sistema, que não pode ser absorvido pelo gerador.

A estratégia de controle de potência x frequência pode ser compreendida através da curva P x F. Esta curva de geração é seguida pelo inversor quando este modo de operação é selecionado. Como se vê na Figura 18, para frequências até 60,2 Hz o sistema fotovoltaico pode gerar 100% de sua potência.

Quando a frequência aumenta acima de 60,2 Hz, sinalizando que existe excesso de energia no sistema, a potência do inversor fotovoltaico vai sendo reduzida gradualmente até que a frequência do sistema alcance 61,2 Hz, quando a potência do inversor será zero.

O sistema de controle P x F mostrado anteriormente funciona bem em pequenas microrredes, tipicamente com alguns inversores operando em paralelismo com apenas um gerador a diesel.

Nos sistemas de maior porte e maior potência, quando existem múltiplos geradores a diesel ou múltiplos inversores, a solução de controle de potência pela variação da frequência pode não apresentar a robustez necessária para oferecer a máxima confiabilidade à operação do sistema.

Em casos assim é recomendável a existência de um sistema denominado power plant controller (PPC) – controlador da planta de potência.

Este controlador pode ter muitas funções, mas neste caso específico da integração solar-diesel ele basicamente realiza a leitura da potência consumida pela carga e regula a geração do sistema FV por meio de linhas de comunicação. A grande diferença em relação ao controle potência x frequência é que existe uma comunicação direta para envio de sinais de comando do PCC para os inversores.

A maneira como o PPC conversa com os inversores pode variar de um fabricante para outro. Tomando como exemplo a solução da SolarEdge, um inversor “líder” realiza a comunicação direta com o PPC, enquanto os demais inversores “seguidores” comunicam-se com o “líder” para receber instruções.

O PPC é o cérebro do sistema. Ele cuida para que a geração a diesel nunca fique abaixo do limiar inferior de potência do gerador (tipicamente em torno de 30% da potência nominal, como comentamos anteriormente).

Os inversores receberão sinais de comando para a redução da sua potência de saída sempre que houver redução da potência consumida pela carga e a potência mínima do gerador a diesel tiver sido alcançada.

Com o uso de controladores de planta (PPC) é possível constituir sistemas híbridos solar-diesel de grande capacidade, capazes de alimentar de forma ilhada – desconectada de qualquer rede elétrica pública – consumidores de qualquer tamanho: plantas industriais, plantas de mineração, propriedades rurais ou mesmo uma pequena cidade.