Um novo cenário para o financiamento de projetos de energias renováveis

19/08/22 | São Paulo

Reportagem publicada pelo Jota

A energia solar, em forte alta nos últimos anos no Brasil, deve ganhar mais um impulso importante, sobretudo para a realização de projetos de médio e grande porte. Em julho de 2022, o Congresso Nacional derrubou dois vetos do Palácio do Planalto na sanção da Lei 14.300/2022 – Marco Legal da Geração Distribuída –, possibilitando agora que projetos desta modalidade sejam enquadrados no benefício fiscal do Reidi, além de assegurar a elegibilidade para a emissão de debêntures incentivadas e de fundos de investimento FIP-IE.

Com mais de 98% da potência instalada na modalidade de geração distribuída no Brasil, o setor de energia solar fotovoltaica comemorou a derrubada dos vetos, que permite o acesso a melhores condições de financiamento, reduzindo o custo dos projetos, atraindo investimentos no setor e possibilitando a ampliação dos benefícios econômicos e ambientais da utilização desta fonte de energia.

O Regime Especial para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi) foi instituído com o objetivo de reduzir o custo inicial de obras de infraestrutura e atrair o capital privado. O enquadramento de projetos de geração distribuída no Reidi permite, na prática, a suspensão da incidência de Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) sobre a aquisição de equipamentos, prestação de serviços e materiais de construção.

As debêntures são títulos de dívida emitidos por empresas que oferecem direito de crédito ao investidor. Consistem em um tipo de empréstimo a empresas, por meio do qual quem investe nas debêntures torna-se credor da companhia emissora. As debêntures incentivadas, por sua vez, são aquelas que contam com isenção de Imposto de Renda ao investidor sobre a rentabilidade. Já os fundos FIP-IE (Fundos de Investimento em Participações em Infraestrutura) trazem à pessoa física isenção de IR sobre rendimentos e alíquota de 0% sobre o ganho de capital.

As duas modalidades de investimento são, portanto, novas e atrativas alternativas de financiamento de projetos de geração distribuída, que reduzem os custos de capital e, por conseguinte, os custos totais deste tipo de projeto. O enquadramento no Reidi consiste em mais um mecanismo de isenção fiscal ao setor, reduzindo os custos de projetos e aumentando a atratividade para investimentos e contribuindo para a viabilização de novos projetos.

Em relação às debêntures incentivadas, o que se nota é que os títulos podem oferecer retornos acima da média da renda fixa, superando CDBs, LCIs e LCAs, sendo, portanto, atrativos para determinados grupos de investidores, dispostos a assumir riscos mais arrojados. Os investidores interessados devem fazer uma boa pesquisa sobre o histórico e o balanço da empresa emissora, de forma a compreender o perfil de risco ao qual se expõe – e um dos principais fatores que confere solidez a este tipo de investimento são as garantias, que podem ser ofertadas na modalidade de garantia real ou flutuante.

Aplicando esses conceitos de debêntures para as usinas fotovoltaicas enquadradas na geração distribuída, a garantia real seria mais atrativa no quesito de segurança financeira ao investidor, visto que a energia elétrica é um bem de extrema importância e seus contratos de concessão e operação são de longo prazo e com ganhos relativamente previsíveis. Além disso, o ativo que compõe esse tipo de infraestrutura é passível de liquidez devido ao seu alto valor agregado. Assim, na modalidade da garantia real, a empresa emissora das debêntures pode negociar a venda da usina, desde que haja aprovação dos acionistas.

Um outro tipo de garantia muito comum são as garantias flutuantes. Nestes casos, a empresa oferece ao seu investidor uma série de ativos reais de sua propriedade, como forma de assegurar o pagamento do título emitido. O termo “flutuante” é atribuído pelo fato de que estes ativos não são definidos anteriormente, podendo haver trocas dos bens dados como garantia.

Em suma, as garantias e as modalidades de contrato de fornecimento de energia elétrica consistem em fatores primordiais a serem observados por emissores e investidores de debêntures incentivadas na geração distribuída, sendo mecanismos capazes de reduzir os riscos dos investimentos e viabilizar taxas atrativas.

Em relação aos projetos de geração distribuída voltados para o setor público, cujo potencial de replicabilidade já foi tema abordado nesta coluna , destaca-se que a derrubada dos vetos também vem sendo considerada uma excelente notícia para os interessados em PPPs de geração de energia elétrica por meio de usinas fotovoltaicas. Um dos grandes desafios vividos pelas concessionárias em contratos vigentes vem sendo a obtenção de financiamentos para os projetos – e as debêntures incentivadas, bem como os fundos de FIP-IE, surgem como alternativas viáveis para a obtenção do capital de investimento para a construção e operação dos ativos.

Para além disso, o enquadramento no Reidi se apresenta como mais um mecanismo para a redução dos custos de projetos desta natureza, aumentando, por conseguinte, os benefícios econômicos ao poder concedente e conferindo atratividade ao setor privado.

No caso de projetos de PPP, as garantias reais e flutuantes não podem ser aplicadas, dado que as usinas são ativos pertencentes ao Estado, não sendo, portanto, passíveis de liquidação para o cumprimento de compromissos com investidores. Porém, as próprias garantias ofertadas pela administração pública em seus contratos de concessão administrativa podem ser uma ferramenta de segurança aos investidores, além de uma solidez no contrato que garanta segurança jurídica.

O que se espera com as novas medidas é que novos projetos surjam e que se mantenha o ritmo intenso de crescimento do setor de energia solar no Brasil. Sem dúvidas, a elegibilidade de projetos de geração distribuída para o Reidi, debêntures incentivadas e FIP-IE é uma boa notícia e que deve ser comemorada pelo setor, tanto em projetos voltados para o setor privado quanto para o público.

Como próximos desafios neste sentido, destaca-se que a definição adequada dos mecanismos de garantia para estes financiamentos, considerando a realidade de cada empreendedor e buscando atrair os mais diversos tipos de investidores, pode ser um caminho para viabilizar o crescimento desta fonte de energia, limpa e renovável, agregando valor econômico aos projetos desta natureza e viabilizando os demais benefícios, tanto ambientais quanto outras externalidades positivas.